A escritora Maria Velho da Costa já tem sido mencionada no Em Cada Rosto Igualdade, nomeadamente a propósito do livro Novas Cartas Portuguesas (ver coluna à direita). Agora foi distinguida com o Prémio Vida Literária APE, um bom pretexto para vir para a nossa galeria «Mulheres na Cultura». Comecemos pelo retrato que dela se faz no JL de 11 do corrente mês de dezembro:
Como se pode ver, trabalhou na Administração Pública, nomeadamente na Cultura, aquando do Governo de Maria de Lurdes Pintasilgo. Foi nessa altura que a conhecemos pessoalmente, claro que os seus livros já vinham de trás, e lembro algum nervosismo ao estar-se perante «a escritora», e admirar como se integrava como qualquer outra pessoa naquelas reuniões tão diversas. Mas aquele olhar era especialmente atento. Boas recordações. E voltemos ao prémio e, por exemplo, à intervenção do Presidente da República:
Prémio entregue na Culturgest
«Entendeu a Associação Portuguesa de Escritores atribuir, este ano, o Prémio
Vida Literária à romancista Maria Velho da Costa.
É uma decisão com a qual não posso senão congratular-me, interpretando o
sentimento dos seus leitores e admiradores.
O percurso de Maria Velho da Costa, ao longo de quase meio século de
publicações e de intervenção no nosso meio cultural, é de facto
extraordinário.
Talvez não corresponda ao que vulgarmente se chama uma carreira.
Mas os verdadeiros escritores, como ainda há bem pouco tempo dizia o
moçambicano Mia Couto, não têm propriamente uma carreira, pois continuam a vida
inteira a experimentar «os mesmos receios e as mesmas preocupações», de cada vez
que iniciam um novo livro.
Os escritores como Maria Velho da Costa não têm uma carreira, têm uma
obra.
A sua história confunde-se com as histórias que nos deram através da
palavra.
É nos livros que escreveram e nas personagens que criaram que está a sua
identidade.
É por isso que nós falamos, a propósito de grandes escritores como Maria
Velho da Costa, de uma vida literária.
O reconhecimento da obra de Maria Velho da Costa foi praticamente unânime,
desde a publicação do seu primeiro romance, Maina Mendes». Continue a ler.
E continuemos com a imagem das três Marias, um «ícone»:
E com este video - MULHERES E REVOLUÇÃO - das Palavras Ditas de Mário Viegas, onde se diz obra de Maria Velho da Costa :
Pode ler aqui em texto escrito, donde tirámos:
REVOLUÇÃO E
MULHERES
1. RECONSTITUIÇÃO DA FORÇA DE
TRABALHO
Elas são quatro milhões, o dia nasce, elas
acendem o lume. Elas cortam o pão e aquecem o café. Elas picam cebolas e
descascam batatas. Elas migam sêmeas e restos de comida azeda. Elas chamam ainda
escuro os homens e os animais e as crianças. Elas enchem lancheiras e tarros e
pastas de escola com latas e buchas e fruta embrulhada num pano limpo. Elas
lavam os lençóis e as camisas que hão-de suar-se outra vez. Elas esfregam o chão
de joelhos com escova de piaçaba e sabão amarelo e correm com os insectos a que
não venham adoecer os seus enquanto dormem. Elas brigam nos mercados e praças
por mais barato. Elas contam centavos. Elas costuram e enfiam malhas em agulhas
de pau com as lãs que hão-de manter no corpo o calor da comida que elas fazem.
Elas vêm com um cântaro de água à cinta e um molho de gravetos na cabeça. Continue a ler.
«Num discurso curto, que antecedeu o do Presidente da República, Maria Velho da Costa salientou que a literatura não é só a escrita, mas, igualmente, "o poder da palavra e o seu gosto, descrita ou dita por aqueles que a falaram, escreveram e inscreveram em nós um modo de ser para a escrita".
"A literatura é por certo uma arte, um ofício, com o seu tempo de
aprendizagem, treino, de escuta incansável, mas também a palavra no tempo, na
história, no apelo do entusiasmo do que pode ser lido ou ouvido, a busca da
beleza ou da exactidão ou da graça do sentir", disse, antes de aludir
ao carácter repressivo dos regimes totalitários.
"Os regimes totalitários sabem que a palavra e o seu cume de fulgor,
a literatura e a poesia, são um perigo. Por isso queimam, ignoram e
analfabetizam, o que vem dar à mesma atrofia do espírito, mais pobreza na
pobreza", acrescentou». Leia mais.
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