«O que estás a tentar fazer nem sempre tem bons resultados. Deita fora essa proximidade contigo, põe de lado esse feitiço da rememoração a quente. Põe o lamento na boca de outrem. Desfaz essa amizade com o teu próprio lamento. Deita pela borda fora os objectos sensíveis com os quais encheste a memória, alguns são surpreendentes, mas tens de te livrar deles e talvez te reapareçam desfigurados, macerados pelas ondas, transformados em pertenças do mar. Já não são mais teus, já não te protegem. Estão prontos para serem pastos das tuas chamas. Assim como os tens são refractários ao fogo, não consegues transformá-los em cinzas. E é isso por que anseias, sem saberes como fazê-lo. Tenta o que te disse. Requer uma disciplina feroz, uma frieza, um desprendimento, a que terás de obedecer sem teres de te decidir. Às vezes, sem dares por nada, já começaste a experiência que, também inadvertidamente, interrompes, e de novo te prendes amorosamente às tuas lembranças. Não encostes o ouvido à concha, o segredo que ouvias foi enterrado. Agora desce entre os mortos. Ao terceiro dia, ressurreição. Isso não sei.»
Do capítulo «Motivos obrigados». Saiba Mais.
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Uma entrevista da autora - «A vida que não é digna de
ser vivida tem de cessar» - aqui, no DN.
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